segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Saiu na Science!

Para quem não sabe, a Science é uma das mais respeitadas revistas científicas do mundo. E na edição de 15 de outubro de 2010 (bem fresquinha!), Jared Diamond, renomado cientista, escreveu um artigo – The Benefits of Multilingualism - comentando os últimos avanços no conhecimento sobre bi ou multilinguismo infantil. Quem estiver interessado em ver o artigo (ou algum dos artigos da bibliografia), deixe um endereço de email que eu posso tentar enviar (só não sei se da universidade eu tenho acesso a todos os artigos. E são todos em inglês). Muitas das informações contidas nesse trabalho já foram objeto de posts e comentários no blog, mas como saiu na Science, vale à pena repetir! Bem, vamos ao que interessa:

Os Benefícios do Multilinguismo

O multilinguismo - a habilidade de se comunicar em diversos idiomas – é uma coisa rara nos Estados Unidos e no Brasil, mas faz parte da vida cotidiana em várias partes do mundo. Existem lugares onde o normal é falar 2, 3, 4, 5 ou mais idiomas e o estranho é falar apenas um. Estudos recentes (1-5) mostram que crianças criadas em bilinguismo apresentam certos befícios cognitivos na infância e que o bilinguismo é também capaz de dar certa proteção ao indivíduo contra a demência provocada por Mal de Alzeheimer quando idoso.

A educação bilíngue gera controvérsia nos Estados Unidos até mesmo entre pais imigrantes que acreditam que seus filhos devem aprender apenas ingles para evitar que a criança fique “confusa” por aprender dois idiomas simultaneamente. Eu canso de escutar isso de brasileiros e não me surpreende, pois o Brasil também é um país monolíngue e o preconceito parece que “dá filhote”! Quando falo “preconceito” refiro-me a julgar sem ter meios para tal, sem ter informação correta. Ninguém faz por mal, é falta de conhecimento mesmo, afinal esse não é o nosso “normal”. E até os anos 60, as pesquisas mostravam que as crianças filhas de imigrantes e criadas em bilinguismo, adquiriam linguagem mais tardiamente e tinham vocabularies significantemente menores que seus pares monolíngues. Esses estudos podem ser descartados porque não levavam em consideração fatores importantes como nível educacional dos pais e situação sócio-econômicas. Mais recentemente e corrigidos esses fatores, não existem diferenças significativas em cognição e processamento de linguagem entre crianças bi e monolíngues (6-8).

Na verdade, a diferença mais clara nesses estudos mostra que os bilígues têm, na verdade, mais vantagens que desvantagens sobre os pares monolíngues. As nossas mentes são invadidas o tempo todos por diversos estímulos: sons, cheiros, visões, sentimentos sobre estado (dor, por exemplo) e posições das partes do nosso corpo e, para que possamos realizar alguma (qualquer) tarefa, precimos “desligar” 99% das percepções que nosso cérebro recebe e trabalhar com apenas 1% delas. Desse modo, para responder a uma pergunta ou para amarrar os sapatos, precisamos parar de prestart atenção a quase tudo que acontece a nossa volta para nos concentrar nessas determinadas tarefas. Isso se chama atenção seletiva, que envolve uma série de fatores chamada função executiva, e é desenvolvida durante os primeiros 5 anos de nossas vidas (9).

Pessoas multilingues têm um desafio maior que os monolíngues envolvendo a função seletiva; monolíngues que escutam uma palavra necessitam apenas buscar o seu significado dentro de um único sistema fonético e grammatical que está dentro de um único estoque linguistico. Bilíngues em português/italiano, por exemplo, mantêm estoques linguísticos distintos e, ao ouvir uma palavra como “burro” interpretam como um “animal” no contexto linguistic português e como “mateiga”no contexto italiano. Multilíngues que participam de conversas multilíngues têm que mudar de estoque linguistic o tempo todo. Imaginem que exercício cerebral fabuloso é esse!

Estudos recentes que testam a função executiva de acesso aos diferentes (ou único) estoque linguistico, mostram claramente a habilidade maior de lidar com mudanças das crianças multilíngues (1-3, 7, 8). Um exemplo é quando se mostram cartões com figuras de barcos ou de coelhos, que podem ser vermelhos ou azuis, com ou sem uma estrela em cima. Se o cartão tem uma estrela, a criança deve separar por cor (vermelho ou azul); se não existe a estrela, a separação deve ser por tipo de objeto (Coelho ou barco). Bilingues e monolíngues têm resultados semelhantes caso seja dada uma ordem e essa não mude (“separe por cor”). Quando a regra muda (”separe por tipo de objeto”), os multilíngues se saem muito melhor.

Outro estudo interessante foi feito por Kovács and Mehler (4,5), onde crianças monolíngues foram comparadas com as bilíngues desde o nascimento (quando os pais falam separadamente em diferentes idiomas com os filhos desde o nascimento) no seguinte teste: as crianças dos dois grupos eram condicionadas a ouvir uma trisílaba sem sentido (ex. “lo-lo-vu”) antes de aparecer a foto de um filhote de cachorro do lado esquerdo da tela do computador. Após 9 tentativas, todas as crianças olhavam automaticamente para o lado esquerdo da tela após ouvir a referida trisílaba, esperando ver a foto do filhote. Após isso, os pesquisadores passaram a apresentar uma trisílaba diferente (ex.”vu-lo-vu”) e o filhote aparecia ao lado direito. As crianças bilíngues “desaprenderam” a olhar para o lado esquerdo e aprenderam a olhar para o lado direito quando ouviam a nova “palavra”após apenas 6 tentativas. As monologues não foram capazes de realizar a “troca”, mesmo após 9 tentativas. Evidentemente, interagir com o pai e com a mãe usando dois idiomas distintos e mudando de estoque linguistic frequentemente, prepara melhor as crianças bilíngues a lidar com mudanças imprevisíveis de regras.

Mas sera que esses achados sugerem que os bilíngues são melhores em lidar com regras de linguagem como trocar de “lo-lo-vu” para “vu-lo-vu”? Bem sem aparente vantagem para quem ainda está na dúvida sobre criar os filhos em bilinguismo, não? Então vamos falar de situações práticas importantes como a proteção contra a demência do Mal de Alzheimer(10). Entre centenas de idosos no Canadá, os pacientes com Alzheimer que eram bilíngues demoraram cerca de 5 anos a mais que os monolíngues para apresentar os primeiros sintomas, significando isso, uma queda de 47% de chance de a pessoa apresentar Alzheimer antes de morrer (considerando expectative de vida de 79 anos).

Como isso pode ser? Simples regra que vale também para o cérebro: “use-o ou perca-o”. A mesma regra vale para outras funções que desempenhamos. É por isso que os atletas e os músicos treinam, certo? O bilinguismo é, sem sombra de dúvidas, uma forma de exercício constant do cérebro. De modo consciente ou inconsciente, o cérebro tem que decidir constantemente sobre falar, pensar ou interpreter sons de acordo com o idioma A ou B!

Ainda existem, obviamente, perguntas a serem respondidas pelos cientistas. Por exemplo, ser criado em bilinguismo nos dá 5 anos a mais de proteção contra Alzheimer, mas sera que aprender um terceiro ou quarto idioma aumenta isso? Teria uma pessoa que fala 5 idiomas 25 anos a mais de proteção? Se a criança não for criada em bilinguismo desde o nascimento, aprender um Segundo idioma na idade escolar faz com que ela alcance os mesmos benefícios? Quais os mecanismos específicos cerebrais envolvidos na proteção a Alzheimer?

Essas e outras questões emergentes ainda estão para serem estudadas…vamso torcer para que isso aconteça logo, mas acredito que já tenhamos os argumentos para nos empenhar em ajudar nossos pequenos brasileirinhos a falar o nosso português, certo?

Referências

1. 1. E. Bialystok, Dev Psychol. 46, 93 (2010)

2. 2. E. Bialystok, X. Feng, Brain Lang. 109, 93 (2009)

3. 3. E. Bialystok, M. Viswanathan, Cognition 112, 494 (2009)

4. 4. A.M. Kovács, J. Mehler, Science 325, 611 (2009)

5. 5. A. M. Kovács, J.Mehler, Proc. Natl. Acad. Sci. U.S.A. 106, 6556 (2009)

6. 6. E. Bialystok, Bilingualism and Development (Cambridge Univ. Press, New York, 2001)

7. 7. S.M. Carlson, A.N. Meltzoff, Dev. Sci. 11, 282 (2008)

8. 8. A. Costa, M. Hernández, N. Sebastián-Gallés, Cognition 106, 59 (2008)

9. 9. T. Shallice, From Neuropsychology to Mental Structure (Cambridge Univ. Press, Cambridge, 1988)

10. 10. E. Biaslytok, F. I. Craik, M. Freedman, Neuropsychologia 45, 459 (2007)

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

domingo, 10 de outubro de 2010

Vídeo game e dever de casa

Bem, eu ando sem tempo de escrever posts, mas deixo registrado alguns vídeos recentes. Por esses dias eu volto pra postar alguns do Daniel também! :)





Que idioma você fala com seu(s) filho(s)?